Let Down

sábado, 9 de maio de 2009
Postado por Memoria Afetiva 7 comentários

"Don`t Get Sentimental

It Always ends up Drivel"

Thom Yorke

Passei o dia te procurando. Nos meus sonhos, ao vivo ,tentei te buscar em todos os lugares.E você não estava em nenhum lugar.Você correu de mim o dia todo sem saber,ou sabendo,tentou me evitar.Te mandei mensagem.Tentei te ligar.Passei no seu trabalho.E você não estava nunca.Não consegui me concentrar em nada nesse dia.Cheguei a casa cansado, entrei na internet e esperei você entrar.Você não entrou, eu esperei, esperei...
E nada.
Não consegui dormir, pois precisava falar contigo, receber uma resposta, sentir o som da sua voz através da sua escrita. Mandei algumas mensagens em off pelo computador pra você receber depois e me dizer algo,ao menos um “oi”.Mas você não respondeu nada.Já era tarde; eu já tinha falado com todos.Todos já tinham puxado algum assunto, falado de suas vidas desinteressantes, dos seus infortúnios e desamores cotidianos.E eu só lia e respondia às vezes um “prossiga” bem psicanalista, sem o menor saco pra problematizar nada.Estava angustiado, agoniado, querendo ouvir e ser ouvido; não queria ter que me haver com problemas de ninguém.Estava louco querendo te ver, te sentir,escutar um pouco da sua voz, tocar a sua pele ou pelo menos sentir que você estava comigo, mesmo em silêncio, ainda que apenas sentindo sua presença no ar.Eu precisava disso, mas nada aconteceu.
Enfim, as horas passaram; passou tanto tempo que a fome chegou, o sono chegou, a paciência que houvera se esgotado há horas até voltou, e quando as coisas pareciam estar em ordem de novo, quando eu já tinha abstraído sua ausência e me convencido de que tudo não passava de um mal entendido, de que nossas histórias não iam mesmo dar certo: você chegou. Dei um pulo, meu coração disparou, saí de mim. Por um segundo, antes de sequer pensar, pensei em colocar os dedos no teclado e digitar uma mensagem, te enviar algo para que você pudesse me notar, para que você soubesse que eu estava ali te esperando e que passei o dia a esperar.Foi então que respirei fundo algumas vezes, contei até 5 e desliguei o computador.Desliguei o computador e fui dormir.Acumulei paciência demais nessa experiência, não queria mais ter que me haver com você; estava tão calmo e tão seguro que peguei no sono muito rápido, ao contrário dos outros dias que pensava em você antes de dormir e isso consumia parte da minha madrugada.Depois desse dia de tanta espera eu estava esgotado.Não há nada mais agoniante do que a experiência da espera, a sensação vazia da passagem do tempo em vão.Quanto mais se espera, mais a agonia se prolonga.
No dia seguinte apaguei você dos meus contatos, fingi que nunca sequer houve um encontro entre nós, fingi não saber seu nome, fingi não ter te conhecido. E tentei não esperar mais nada. Tentei não lembrar de mais nada.
Não quero saber o que houve, não quero motivos, exames, desculpas. Não quero mais nada. E pela primeira vez não sofro por isso, pois aprendi a me desapaixonar, aprendi sobre a dinâmica da vida e a transitoriedade das coisas, aprendi então que os amores e paixões são líquidos, nós é que damos forma, sentido a eles, aprendi a deixar pra lá e simplesmente abstrair sem que isso ficasse marcado em mim.Se até agora você não me procurou, é porque tudo o que fiz para não querer mais te ver, para te esquecer foi legítimo.Se ainda escrevo e me recordo do que aconteceu é apenas pra não perder a oportunidade de dizer que superei o desejo pela impossibilidade E essa será minha última memória sua.

sexta-feira, 10 de abril de 2009
Postado por Memoria Afetiva 8 comentários

Há poucos meses, pouco depois de eles terminarem, ele viajou, e nesse viagem um rapaz da cidade o parou e colocou uma pulseira azul em seu braço esquerdo e pediu-lhe de forma gentil que ele fizesse três pedidos, "um pedido para cada nó” falou ele com tranqüilidade e sabedoria.Moderado, o visitante, não pediu nada para si; fez apenas um pedido e desejou com todo o coração que ele se tornasse real um dia.Quando ele desejou isso não sabia de muita coisa;geralmente quando deseja-se algo a primeira coisa que vem a nossa cabeça são as nossas urgências, aquilo que nos corrói, nos acomete de imediato.Em cada nó dado, ele reforçava o pedido, cada vez de uma forma diferente, mas essencialmente o mesmo.Não queria ter duvidas quanto na possibilidade de dar certo mesmo, o pedido fosse entendido integralmente pelas partes cabíveis à sua realização.
Encontraram-se no mesmo lugar de sempre, no cenário deles, as pessoas passando, o sino da igreja tocando, as mesmas músicas soando em silêncio na cabeça de cada um, o mesmo choro.Eles tinham terminando o namoro há algum tempo, e desde então não se viram mais, não ficaram mais sozinhos para conversar.E então tudo aconteceu, no contar e recontar das suas histórias, as vidas deles mais uma vez se enlaçaram e então eles puderam se ver de novo únicos e não dois seres separados.Puderam ver de novo a unidade que faz sentido sempre, a unidade que não necessitava de palavras pra dizer, ou melhor nem cogitam dizer, porque já sentem, e quem sente não precisa de palavras pra falar aquilo que lhe é natural.E então, mais do que palavras, mais do que tudo, já emocionados com tudo aquilo que já tinham passado, com toda a história deles, com todas as lembranças, abraçados, sentados na escada, choraram um choro de felicidade pelo reencontro, mas ao mesmo tempo um choro de dor, que a princípio não deveria ser tido como um choro alegre, pois por si expressava a distância, expressava o distanciamento e a obrigação dessa separação que se fazia latente.Ali foram recontadas algumas histórias, alguns fatos do passado foram renarrados sob ângulos surpreendentes aos dois, e muito do conteúdo da vida foi relembrado; foram evocados também os afetos, os sentimentos e com isso o amor reemergiu atravessando-os com sua potência.Naquele momento os dois se sentiram íntegros, integralmente fazendo parte de si próprios, de suas vidas; se sentiram sendo eles mesmos. Parecia que os nós na garganta que antes eram apertados e incômodos foram aos poucos se afrouxando;ele pensou “Talvez essa seja a lógica dos nós:se apertam, tensionam, e depois se desfazem; eles se apertam para nos dizer algo,ou para nos fazer dizer algo...”.Olhou para a pulseira azul no braço e lembrou do pedido feito na viagem.Queria poder dizer tudo, mas nunca se pode dizer tudo, ou pelo menos não de uma só vez.Se sentiam bem mas não foi cogitada a volta, parecia não ser prudente no momento falar de uma possibilidade de retorno.Choraram e cantaram a música tema de suas vidas, se abraçaram e se emocionaram, falaram e fizeram tudo como antigamente, como um filme que volta e volta e está sempre a voltar e a lembrar do correto a ser feito, do que é necessário acontecer para que se viva com a certeza de amar e ser amado.É essa certeza, construída no espaço entre os dois, que os faz vivos um dentro do outro, e isso já faz tanto sentido pra eles que é impossível esquecer, tocar a vida de uma outra forma, imaginar algo outro para além de qualquer vivência comum e cotidiana.Era impensável o fim como o fim.É como se fosse um recomeço, um aprofundamento de sentimentos, uma depuração de emoções, uma peneira de atitudes e falas, um suspensão da vida ordinária para o cumprimento do amor enquanto amor, para a legitimação da vida enquanto um espaço de respiração contínua, para a compreensão do amor e da vida enquanto elementos que se somam e se multiplicam o tempo todo, num processo lento e difícil de refeição, espera, experiências, e muitas vezes sofrimento, angústia e desapontamento, que entretanto se torna mais palatável quando se tem o amor como referencial.
Depois de todos esses momentos de mistura de tensão e relaxamento,de angústia e acolhimento, ele voltou para casa como de costume revivendo todo aquele cenário que já lhe era familiar, passou pelas mesmas ruas, pegou o mesmo ônibus, olhou o mesmo mar que permanecia constante. Quando ele chegou a casa, depois disso tudo, depois de toda essa tensão materializada, depois de todo esse suspiro de vida, de amor, ele olhou para o pulso.A pulseira azul não estava mais lá.Ela tinha arrebentado.