segunda-feira, 27 de dezembro de 2010
Postado por Memoria Afetiva 1 comentários

"Tu não és ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos.
E eu não tenho necessidade de ti.
E tu também não tens necessidade de mim.
Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas.
Mas, se tu me cativas,nós teremos necessidade um do outro.
Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo... "
Antoine de Saint-Exupery
Pensei em ir dormir pra ver se a dor passava, mas acho que ela ficou levemente mais intensa quando acordei e vi que no telefone não tinha nenhuma chamada sua, nenhuma mensagem. Quando ligo o computador, vejo que não tem nada seu, nenhum convite me chamando pra dar uma volta, ou fazer algo que de costume fazíamos. Sinto o cheiro do que é confuso no ar.Sinto o cheiro do mal acabado que exatamente por isso não se esgota, mas fica torturando aos poucos, tentando extrair da carne a última gota de sangue que sobra à vida.
Bem, tudo começou quando eu já achava que tudo ia terminar. Não, as minhas histórias nunca começam pelo começo. São sempre não convencionais, e não estou reclamando disso. Tenho uma atração significativa pelo não convencional. Agora, estou tendo a sensação de estar escrevendo mais leve, mais solto, de forma como não costumava fazer.Entretanto acho que é apenas sensação,pois me sinto pesado,e as palavras lentamente vão tentando assumir o lugar dos sentimentos.Em vão.Totalmente sem sentido.Embora elas ajudem a ressignificar os sentimentos,eles ainda me afetam,e enquanto escrevo é como se revivesse e pudesse recontar a minha história,e talvez isso seja interessante pois dá a tal leveza aparente apaziguadora à consciência.O início.Uma pessoa tímida que me chamou bastante atenção.Pela timidez,pelo olhar,pela pele,pelos gestos,pela fugacidade,e certamente pela impossibilidade de eu estar com ela.Bem,é nesse ponto que relembro aos desavisados da atração morbidamente humana pela impossibilidade.Já era assim com Tristão,com Isolda,com Romeu,Julieta, Ruth e Raquel, com Piaff,com Maisa, com Gaga e Alejandro e agora comigo.É um tropismo bastante estranho,eu preciso assumir,mas algo que é presente na história do homem.Bem,o que importa:eu fui atravessado pela impossibilidade,e de início foi tranqüilo.Ora,tantas impossibilidades na vida,e não é por isso que estamos aí loucos nos jogando nos abismos do mundo em uma busca infinita por aquilo que temos a certeza que não vamos conseguir.A-há; mas é aí,exatamente aí que muda tudo.Não há certezas na vida,anote.Levado pelo impossível até o meio do ano,fiz eu questão de recalcar nos recônditos do inconsciente o tal desejo pelo impossível.Estava lá guardadinho, reprimido e recalcado.Eis que o olhar que até então era neutro passou a ser polarizado,a distância dos corpos começou a encurtar,convites começaram a surgir,e um certo ar de bad romance disfarçado de companheirismo começou a brotar.Ora,eu apenas deixei rolar.E,de grão em grão,não é que a galinha enche mesmo o papo?Pois bem, era isso.O impossível ironicamente se tornou real,tátil,e daí o desejo voltou à cena, inicialmente com pudores e medos, mas depois de conversas, manobras, jogos, estratégias,olhares;depois de muitas e muitas filosofias desde as coisas mais inúteis até o sentido da vida,depois disso tudo, finalmente aconteceu.E tudo aconteceu sem reflexão, no impulso da vida quase que em silêncio.E agora é esse silêncio que eu temo; é a ele que me refiro quando falo em vão que estou angustiado e preciso de vozes,das nossas antigas conversas sobre o nada e o mundo.Mas parece que é difícil falar de nós.Pois falar dos outros,e falar da vida é tranqüilo,analisar o outro é confortável,mas quando falamos de nós,parece que a fala pesa,e então o silêncio entra pra deixar soar.Para deixar soar aquilo que não conseguimos dizer e assumir para nós mesmos.